- O mercado de trabalho no Sul é mais organizado, num reflexo do desenvolvimento econômico dos seus estados - resumiu João Saboia, professor do Instituto de Economia da UFRJ.
Campo Alegre do Fidalgo, no interior do Piauí, ostenta a pior taxa de desemprego do país, de 41,82%, de acordo com o último Censo. Na pequena cidade, moram cerca de 4.600 pessoas, boa parte vivendo na zona rural. A lista dos municípios com elevada desocupação passa ainda por outros estados do Nordeste e Norte do país. Pernambuco contribui com três nomes, sendo que o pior cenário aparece em Araçoiaba, a 60 quilômetros de Recife. Lá, a desocupação atinge taxa de 23%.
Em Araçoiaba, oferta de trabalho é coisa rara na cidade, onde só há um grande empregador: a prefeitura. O município, que é dono do pior Índice de Desenvolvimento Humano da Região Metropolitana, não tem uma só indústria. Seus 21 mil habitantes vivem do pequeno comércio (cerca de 60 lojas) e da agricultura de subsistência.
Para o secretário de Infraestrutura e Habitação de Araçoiaba, José Rinaldo Silva Rufino, os números do desemprego levantados pelo IBGE podem estar defasados, por causa da nova realidade econômica vivida em Pernambuco, onde estão sendo implantados polos de desenvolvimento na Região Sul (como o complexo industrial de Suape) e Região Norte do estado (que vem sendo preparada para sediar a sua primeira indústria automobilística, a Fiat). Ele afirma que o dinamismo da economia pernambucana começa a mudar o marasmo em que Araçoiaba vivia antes mergulhada.
- Temos três usinas próximas que empregam mais durante os períodos de colheita, mas há trabalho na entressafra, quando precisam de lavradores para o trato cultural nos plantios de cana. Muitas pessoas da cidade estão trabalhando na construção do presídio de Itaquitinga (cidade vizinha). E há muita gente empregada na construção da Hemobrás (na cidade de Goiana) e de indústrias que vêm se instalando no porto de Suape (no litoral sul pernambucano). São soldadores, montadores, pedreiros e serventes.
Diariamente, quatro ônibus deixam a cidade para conduzir esse pessoal aos seus postos de trabalho, afirma ele. Alguns dos que têm empregos, como os filhos de Maria de Lourdes Gomes, só vêm a Araçoiaba nos fins de semana:
- Eles procuraram muito emprego por aqui. Não acharam nada, foram tentar lá em Suape. Como a passagem de ônibus é cara, ficam por lá mesmo - afirma a pensionista, referindo-se a Severino Augusto e José Augusto.
Ex-morador de favela, Gerson de Freitas, de 35 anos, mora há dois anos em uma casa de alvenaria, cedida pelo poder público e construída em um terreno doado por uma usina. Ele tem cinco filhos e a mulher está doente. Analfabeto, nunca teve carteira assinada e até já desistiu de procurar emprego:
- Tem dia que trabalho como moto-táxi com uma moto emprestada por um amigo. Em outros, preparo lambedor (xarope para tosse) para vender em casa. Mas, para fazer o lambedor, fico feito o menino da abelha, tenho que ir para a mata procurar mel - disse Freitas, acrescentando que a carteira profissional nunca teve serventia. - É tão velha que até a foto já se apagou. Mas não tem nada de emprego escrito.
Prefeitura, maior empregador
Além das 60 lojas que existem na cidade (mercadinhos, farmácias, armarinhos), das lavouras de subsistência e do corte de cana durante os quatro meses de moagem, os moradores de Araçoiaba contam apenas com os 737 empregos da prefeitura, dos quais 419 são efetivos. Os demais - comissionados ou temporários - são recrutados na cidade, cuja receita mensal (incluindo os repasses) chega a R$ 2,95 milhões.
Taxas de desemprego muito elevadas, acima de 20%, são a realidade de inúmeras cidades da Europa, em especial na Grécia e na Espanha. Entretanto, os cenários são bem distintos. Enquanto as cidades brasileiras sem emprego são marcadas por boa parte da população sem sequer o nível médio, o contingente de desempregados na zona do euro tem alto nível de qualificação.
Especialistas lembram, contudo, que o país ainda colhe no mercado de trabalho as benesses do crescimento econômico dos anos recentes.
- O mercado de trabalho é um ponto de orgulho da economia brasileira. A fotografia, ainda que tenha sido tirada em 2010, permanece boa. Foi o emprego que segurou os efeitos da crise internacional e, agora, passado o vale, quando não houve demissões, mas menos contratações, é de esperar que o país consiga sustentar esse indicador - afirmou Maria Andreia Parente, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).