quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Documentário »


Filme inspirado no romantismo do brega entra em cartaz no Cine São LuizVou Rifar Meu Coração foi lançado no último Festival de Brasília e estreia no Recife neste fim de semana
Wando participa do filme ao lado de Agnaldo Timóteo, Amado Batista, Lindomar Castilho, Nelson Ned, Rodrigo Mell e Walter dos Afogados. Foto: Vitrine Filmes/ Divulgação
Wando participa do filme ao lado de Agnaldo Timóteo, Amado Batista, Lindomar Castilho, Nelson Ned, Rodrigo Mell e Walter dos Afogados. Foto: Vitrine Filmes/ Divulgação
“Não é um filme sobre a história da canção brega nem um documentário a respeito de dado momento da música popular brasileira. É um filme sobre o amor”, define a cineasta Ana Rieper, quando fala de Vou rifar meu coração. Formada em geografia, cinema e antropologia, a cineasta tem instrumentos de sobra para desvendar a cartografia que explane a paixão de brasileiros que, religiosamente, se convertem aos sucessos defendidos por Waldick Soriano, Nelson Ned, Reginaldo Rossi e Peninha, entre dezenas de outros, ainda que em embalagens distantes da unanimidade. Se não alcança muito da classe média, isso pouco importa para Ana Rieper. “Meu objetivo com o filme não é promover ou resgatar, ou reabilitar essas músicas diante do público A ou B. Quero apresentar o que de mais profundo vejo nelas”, adianta.

Clique aqui para ver os horários dos filmes em cartaz nos cinemas

“Gosto de música boa, o que é um conceito discutível”, diverte-se a diretora, enquanto lista a predileção por letras românticas, samba antigo, funk e jazz. “Para atingir o gosto de uma pessoa que vai além do som, a música passa por uma comunicação que é individual, com acesso direto aos sentimentos”, pontua.

Anônimos que, de fato, vivem histórias de amor presentes em músicas e valores que motivam artistas nas criações são o ponto de partida para o longa-metragem. “O combustível para os intérpretes é a própria história deles. No fim do filme, Agnaldo Timóteo sintetiza: ‘Todas as músicas que fiz falam da minha vida, sobre a minha cama e sobre os meus sofrimentos. Por isso, eu me comunico tão bem com as pessoas’”, destaca Rieper.

De presença eloquente e com vivacidade, Timóteo se tornou figura “muito especial” para a cineasta. “Ele tem um disco chamado Os brutos também amam, e acho que ele é esse personagem: tem arroubos de violência verbal, com postura de machão, mas as músicas são sentimentais demais e ele sofre muito, pela poesia e pela honestidade”, detecta. Mesmo que não esteja balizado pela tristeza (“O filme tem muito humor, equilibrando profundidade, deboche e descaramento das pessoas”), Vou rifar meu coração aposta, por vezes, em elementos severos.

Músicas como Mulher de cabaré e Luz negra (ambas de Roberto Muller) e Vou tirar você desse lugar (de Odair José) ilustram, a exemplo do que verbaliza Lindomar Castilho (“A nossa música é música de cabaré”), o trânsito do cancioneiro nas casas de luz vermelha. “O erotismo que registramos está totalmente associado a situações românticas. É um assunto muito presente no que toca o amor carnal, tramas de abandono e transas de uma noite”, conta a diretora.


ChacotasTraição, inevitavelmente, é tema-chave para o filme. Não pesa tanto, porém, a galhofa associada aos “cornos”, dos quais Alves Correa, o radialista de Arapiraca (interior de Alagoas), é porta-voz. Nos 5 mil quilômetros percorridos para as filmagens de quatro semanas (por Sergipe, Alagoas e Pernambuco, em especial, além de Rio de Janeiro, São Paulo e Goiânia), a equipe de Ana Rieper desconstruiu as chacotas feitas pelos colegas do frentista Maguila (perto de Aracaju), um dos personagens com dores de amores.

“Diante da dimensão sentimental do amor dedicado à mulher que o abandonou, adotar o termo cornudo para Maguila seria empobrecedor e preconceituoso. Ele tem um discurso tão bonito que saiu imediatamente da categoria”, afirma a diretora do filme, feito em suporte digital a partir de R$ 700 mil.

“Delicada e feminina”, a travesti Marquise, moradora do povoado Pedra Branca (a 100km de Aracaju), também desbancou preconceitos. “Ela tem uma vida intensa, com mergulho na opção amorosa que lhe custou muito. Me chamou a atenção a coragem, como assumiu a urgência da condição homossexual num ambiente extremamente conservador, em que isso não é aceito, oficialmente”, avalia.

Se nos anos 1970 (quando Wando, Amado Batista e Diana venderam milhões de discos), a cineasta crê ter existido “um grande movimento da indústria cultural que valorizou a música brega”, a conjuntura atual se distingue. “Ao longo dos últimos 40 anos, a música brega permaneceu no gosto popular, a despeito dos investimentos da indústria cultural”, diz Rieper. Caso gritante está na difusão do “brega novo” que invadiu Recife e se desenha no filme.

Vou rifar meu coração, um projeto acalentado por 10 anos, deriva (em muito) do interesse da carioca de 36 anos por ações sociais (ela atuou em ONG no interior sergipano, por quatro anos) e de seleção “etnográfica” em torno dos temas recorrentes do playlist tachado de brega.

FRASES:
“Você sonha com uma pessoa, faz propostas de amor pra essa pessoa, e daí a pouco a correspondência vem contrária: ‘Olha, eu quero você como amigo’. Isso é a pior coisa que tem”
Wando, cantor
“O amor não é um encontro de orgasmos, é um encontro de almas. Sou um homem romântico. Sou um ser humano romântico”
Nelson Ned, cantor
“Quando eu abri a porta, minha roupa estava assim na sala, em um papelão e ela tinha ido s’imbora com outro rapaz. Aquilo ali foi o maior desespero da minha vida”
Maguila, frentista, fã de Amado Batista

Nenhum comentário:

Postagem em destaque

Homem que sequestrou idosa e pediu resgate de R$ 140 mil em Alagoas é preso no Recife

  POLÍCIA Prisão do sequestrador aconteceu no aeroporto da capital pernambucana Por  Portal Folha de Pernambuco 22/08/24 às 11H55 atualizado...